Entre as muitas funções que exerceu, conta com larga experiência na área do turismo. Enquanto diretor do Departamento de Gestão de Programas Comunitários no Turismo de Portugal foi responsável pelas áreas de desenvolvimento regional, de gestão de programas europeus e pela coordenação da Estratégia Nacional de Turismo 2027, atualmente em vigor. Foi, ainda, perito internacional do Centro Mundial de Excelência dos Destinos.
Conversámos com Nuno Fazenda sobre a retoma da atividade turística em Portugal, a dinamização do destino e a estratégia de promoção dos segmentos de produto em articulação com a política de coesão territorial.
Assumiu recentemente a pasta do Turismo, que se encontra a sair de uma crise pandémica e no contexto de uma guerra a decorrer na Europa. Que setor encontrou e quais os maiores desafios que enfrenta?
Encontrei um setor pujante, resiliente e transformador, a recuperar paulatinamente do período pandémico. Recordo-me de que a palavra de ordem para o ano de 2023, fruto dessa recuperação e de alguma instabilidade geopolítica externa, era “incerteza”. Hoje, a certeza é a seguinte: o turismo é uma das grandes alavancas do nosso crescimento económico, a adaptação tecnológica e a modernização das nossas empresas está a acontecer a um ritmo acelerado e podemos vir a ter um ano recorde, de turismo todo o ano, em todo o território. Para o futuro próximo, os recursos humanos e o turismo em todo o território qualificam-se como dois dos principais desafios. Para isso, para enfrentar os desafios da escassez de mão-de-obra, da sua valorização salarial, do aumento das qualificações e da coesão territorial, nestes seis meses de mandato, lançámos a Agenda para as Profissões do Turismo e a Agenda do Turismo para o Interior – e estamos agora a assegurar a sua concretização.
Acredita haver condições para o turismo em Portugal crescer fora das grandes cidades ou dos produtos “bandeira”?
Portugal, na plenitude do seu território, tem muitas condições para crescer fora dos nossos produtos ou destinos “bandeira”, como, aliás, já o está a fazer. Destinos como Lisboa, Porto, Algarve ou Madeira serão sempre importantes para a captação de mais mercados e para o turismo nacional, porém queremos diversificar a nossa oferta durante todo o ano, em todo o território, cumprindo a estratégia vigente para o turismo em Portugal – a Estratégia Turismo 2027. Produtos turísticos temáticos ou segmentados, como o turismo de natureza, literário, o enoturismo e o turismo militar, entre outros, podem acrescentar valor e dar ao território um ecossistema turístico em que possam prosperar. A Agenda do Turismo para o Interior, com uma dotação global inicial de 200 milhões de euros, quer puxar pelo nosso interior e ligar o turismo do litoral ao resto do país. É uma política pública de turismo, estratégica, com mais de 20 medidas para contribuir para a coesão territorial.
Que papel pode desempenhar o turismo no desenvolvimento e coesão territorial do país?
O turismo tem um papel central na coesão territorial do nosso país. O cariz multiplicador do turismo pode alavancar economias, comércios e indústrias. E, com os incentivos certos e um projeto sustentável, o turismo pode dotar os territórios de uma diversificação económica, o reforço da sua capacidade empresarial e da qualificação do tecido produtivo por via do conhecimento e da inovação. Com mais turismo haverá mais negócios, mais atividade económica, e isso reflete-se sempre na comunidade.
A Rota Histórica das Linhas de Torres trabalha sobretudo os segmentos do turismo cultural e militar das invasões napoleónicas de Portugal, mas também as emoções com base nas experiências de que o turista pode usufruir. No seu entender, como pode o Turismo de Portugal ajudar a alavancar um produto que cruza vários territórios e agentes públicos e privados?
A Rota Histórica da Linha das Torres é um trabalho colaborativo na promoção de um itinerário turístico e cultural. Esta rede, que junta municípios e entidades de natureza pública e privada, é um exemplo de governança e de estruturação de produto turístico, ancorado numa rede que envolve parceiros públicos e privados e que assume o rigor histórico, mas também o storytelling associado à experiência turística. Para além do apoio financeiro a projetos da Rota, o nosso objetivo, o objetivo do Turismo de Portugal, é justamente o de ajudar a alavancar um produto que cruza vários territórios, auxiliando a articulação com as Entidades Regionais de Turismo e com outros parceiros públicos e privados. A concretização deste tipo de projetos permitirá alargar a base da oferta e dos recursos a outros territórios abrangidos pela temática napoleónica, sendo que o Turismo de Portugal, com a colaboração das Entidades Regionais de Turismo e parceiros, está a iniciar a coordenação desse trabalho de estruturação, a uma escala nacional, da rede dos Itinerários Napoleónicos Portugal, contando também, obviamente, com o envolvimento da Rota Histórica da Linha das Torres.
No âmbito do anterior programa Valorizar, do Turismo de Portugal, mas também do COOPERA (Interreg V), foram desenvolvidos alguns projetos que lançaram as bases para a construção de um itinerário napoleónico que atravesse Portugal. De que forma pode um projeto com tantas partes interessadas contribuir para a criação de um produto turístico diferenciado?
No âmbito da Linha de Apoio à Valorização Turística do Interior, financiámos e temos vindo a acompanhar a execução do projeto de estruturação dos Itinerários Napoleónicos, promovido pela CIM Coimbra, pela Rota Histórica da Linha das Torres, envolvendo todos os municípios associados, e, claro, pelo Município de Arruda dos Vinhos. É um projeto diferenciador na medida em que permitirá disponibilizar conteúdos de realidade aumentada e realidade virtual nos recursos abrangidos, para além de outras iniciativas em rede como a Agenda de Eventos itinerários Napoleónicos. Com a conclusão do projeto, durante o 2.º semestre, será possível dar a conhecer aos agentes turísticos dos territórios esta oferta turístico-cultural, no sentido de os estimular a desenvolver programas que podem cruzar a dimensão patrimonial, com atividades de turismo ativo, gastronomia e eventos temáticos. Só com tantas entidades associadas é que se consegue projetar e concretizar tão ambicioso produto turístico, que cruze territórios geográficos e digitais, para promover a diferenciação, qualidade e valor dos nossos produtos turísticos.
Para ser sustentável, o turismo tem de envolver as comunidades e garantir retorno para a população residente. De que forma podem as comunidades beneficiar de um valor turístico “de nicho”?
O turismo é um setor de atividade multiplicador de todas as outras. Quando planeado e concretizado com sustentabilidade, autenticidade e genuinidade, com a satisfação dos residentes como um dos principais indicadores, pode ser uma grande alavanca económica para uma região, para o seu comércio, para a sua restauração e até às indústrias criativas, a título de exemplo. As comunidades com valor turístico “de nicho”, como refere, podem ganhar valor apostando na diferenciação, na qualificação tecnológica, na promoção do destino e do produto, na sustentabilidade ambiental, entre outros, alinhando-se com as grandes tendências de mercado e, sempre, tendo a satisfação dos residentes e dos visitantes como prioridade.
Face à atual situação do turismo em Portugal, que lugar desempenha o turismo militar?
Para o desenvolvimento turístico do país, em alinhamento com os objetivos da Estratégia Turismo 2027, é importante trabalharmos, de forma articulada, com os parceiros dos territórios – entidades públicas e empresas – na estruturação de produtos turísticos que permitam a diversificação de mercados de procura, ao longo de todo o ano e em todo o território nacional. Nesta Estratégia, o Turismo Militar é considerado como um ativo estratégico diferenciador, alicerçado na História, Cultura e Identidade do nosso país, em ativos associados ao património e arquitetura militar presente em todo o território. Temos, neste momento, vários projetos em curso que pretendem reforçar e promover o nosso turismo militar. Os Itinerários Napoleónicos são disso exemplo, mas também o Programa Dinamizar Fortalezas de Fronteira e a Rota dos Templários. A História e a Cultura são ativos estratégicos do turismo nacional.