A classificação do conjunto das primeira e segunda linhas defensivas a norte de Lisboa, ou simplesmente Linhas de Torres Vedras, integra 114 estruturas militares, entre elas fortes, redutos e estradas militares.
Seguir-se-á a criação de uma zona especial de proteção em volta de cada uma das referidas estruturas militares, de forma a garantir a sua salvaguarda e conservação.
Esta classificação, a par com a criação do Dia Nacional das Linhas de Torres em 2014, constitui para a Rota Histórica das Linhas de Torres (RHLT) a confirmação do reconhecimento pelo Estado Português da importância patrimonial, arquitetónica e militar verdadeiramente singulares destas linhas de defesa na história do país e da Europa.
No entendimento da Direção Geral do Património Cultural, um bem é considerado de interesse nacional quando se verifica que a sua proteção e valorização, no todo ou em parte, representa um valor cultural de significado para a Nação. Ora é precisamente esta a avaliação que a RHLT faz do património em causa.
O investimento que tem sido feito desde há vários anos pelos municípios de Arruda dos Vinhos, Loures, Mafra, Sobral de Monte Agraço, Torres Vedras e Vila Franca de Xira na recuperação, reabilitação e divulgação do património das Linhas de Torres possibilitou a sua salvaguarda, chamando ao mesmo tempo a atenção, não apenas para o seu valor histórico, mas também para o seu grande potencial turístico-cultural, tornando-o visitável e compreensível a quem dele queira usufruir.
A figura de Monumento Nacional é, ao mesmo tempo, uma marca e uma ferramenta que reforçam a responsabilização na preservação e salvaguarda do património para o futuro. No caso das Linhas de Torres Vedras cujo elemento patrimonial é extremamente sensível – trata-se de estruturas construídas maioritariamente em terra, com carácter provisório – tal salvaguarda constitui uma obrigação do Estado Português que, articulando-se com os municípios e o Exército – as suas vertentes local e militar – assume a tarefa de perpetuar este testemunho.
As intervenções em zonas especiais de proteção estão, a partir de agora, sujeitas a pareceres vinculativos da Direção Geral do Património Cultural (DGPC) no que se refere a estudos, projetos e obras. A DGPC deve, ainda, acompanhar a elaboração de instrumentos de gestão territorial, considerando a estratégia comum desenvolvida pelos municípios e que tem contribuído para a proteção, recuperação e promoção do património das Linhas. Os seis municípios supracitados trabalham, de modo efetivo, há mais de uma década para estabelecer critérios comuns de gestão e comunicação deste património e para a criação de um produto cultural e turístico de qualidade.
Avizinhando-se uma terceira invasão francesa a Portugal, Arthur Wellesley, conhecido na História como duque de Wellington, ordenou, a 20 de outubro de 1809, a construção de um campo entrincheirado entre o Tejo e o Atlântico que, aproveitando as características acidentadas do terreno, defendesse por terra a península de Lisboa.
O grande objetivo era manter a capital livre das tropas francesas – não só pelo valor estratégico do seu porto, mas também por razões de segurança, uma vez que, em caso de insucesso militar, o embarque do corpo de tropas britânico seria feito em São Julião da Barra.
Conhecedor do território e de vários estudos anteriores sobre a topografia envolvente de Lisboa, Wellington deu instruções claras sobre a estratégia de construção de linhas defensivas: a primeira linha, situada a 13 km da segunda e com uma extensão de 46 Km, ligava Alhandra à foz do rio Sizandro, em Torres Vedras. Tratava-se de uma posição avançada, funcionando em linha com duas obras principais: a elevação de Sobral do Monte Agraço e a de Torres Vedras.
A segunda linha, com uma extensão de 39 Km, ia desde Ribamar, junto à foz do Safarujo, até Póvoa de Santa Iria e intercetava os desfiladeiros de Mafra, Montachique e Bucelas, apoiando-se na Serra de Chipre, no Cabeço de Montachique e nas serras de Fanhões e Serves.
A terceira linha foi erguida para proteção da zona onde eventualmente embarcaria o exército britânico. Aí Wellington ordenou que se melhorasse a defesa à volta da Torre de São Julião da Barra, aproveitando algumas fortificações existentes e construindo mais alguns redutos.
Quando os franceses, por fim atingiram as Linhas, estavam concluídas 126 das 152 obras militares, estendendo-se por mais de 80 km — o sistema defensivo mais eficaz, mas também mais barato, que a história militar europeia conheceu.
Este extraordinário esforço de construção, que durou cerca de um ano, ficou a dever-se ao trabalho incansável da população local que, sob as ordens dos engenheiros ingleses, constituiu uma força braçal considerável, num misto de trabalho forçado e voluntário.
Construíram-se redutos e centenas de quilómetros de estradas militares, traveses, paliçadas e abatises; abriram-se fossos, covas de lobo e trincheiras. Os campos de tiro foram “varridos”, com o corte de centenas de árvores e, em certos pontos, aumentando-se mesmo o declive natural do terreno com escarpamentos. Para maior rapidez nas comunicações foi criado o Serviço de Transmissões Telegráficas, adotado da marinha inglesa, que permitia a transmissão de mensagens em sete minutos entre os extremos das Linhas – do Tejo ao Atlântico.
Muitos moinhos, pequenos e convenientemente cilíndricos, foram incorporados na defesa como postos de observação e em grande parte do território aplicou-se a política da terra queimada, tendo sido desviados ou destruídos, para fúria francesa, todos os consumíveis que pudessem alimentar o exército invasor, o que causou um enorme êxodo da população em direção a Lisboa.
Foi neste cenário devastado, silencioso e privado de quaisquer recursos que as primeiras tropas francesas se confrontaram com as Linhas, a 11 de outubro de 1810.
Optando inicialmente por um bloqueio às Linhas, o marechal francês Masséna haveria de manter-se frente a elas até 15 de novembro de 1810, altura em que iniciou a sua retirada.
A derrota de Masséna nas Linhas de Torres Vedras marcou o início da viragem da carreira vitoriosa de Napoleão Bonaparte, mas a Guerra Peninsular assumiu uma violência superior à de quaisquer outras guerras anteriormente travadas em Portugal, com repercussões gravíssimas e duradouras, tanto a nível económico como social e político.